sábado, 13 de junho de 2015

A viagem do Vietnã aos Laos

Eu olhei no relógio, eram 5 horas da tarde. Tinha acabado de acordar da minha sonequinha depois de uma viagem super cansativa para Sa Pa. Resolvi apenas checar o horário do ônibus para o Laos, que tinha certeza que partia às 9 da noite. Já tinha até confirmado com a menina da recepeçao que me vendeu o ticket! Meus planos eram acordar, tomar um banho e sair para comer algo antes da viagem. Estava faminta só tinha comido o café da manhã as 7 da matina.

Peguei o ticket calmamente e li: pick up time at the hostel, 5PM. 

O que? Como assim? Agora?

Desci as escadas correndo até a portaria, querendo estrangular a menina que havia me confirmado o horário e me certifiquei: 

- O ônibus pra Vientiane sai mesmo as 17? 

-Sim! Quer fazer o check out?

-Nãããão!!! 

Subi correndo novamente, coloquei tudo dentro da mochila e ainda ousei pular debaixo do chuveiro no banho mais rápido da história. As 5 e 10 estava de novo na portaria fazendo o check-out. 

Apareceu um cara berrando algo que não entendi, e o moço da recepção mandou eu segui-lo. Ele parecia bravo porque aparentemente  estava esperando somente por mim. Tudo uma correria, uma confusão, e o menino da recepeçao dizia pra eu ir logo, enquanto ao mesmo tempo eu repetia que queria meu passaporte que havia ficado retido no hostel! Ele parecia tão nervoso quanto eu, e depois de eu repetir pela terceira vez ele entendeu que precisava devolver meu passaporte para que eu pudesse ir.

Segui o cara de camisa azul esbravejante. Ele dirigia uma moto, na contramão, e pediu para que eu e mais outros turistas trouxas (como eu), o seguissem. Andamos umas três quadras seguindo o cara de camisa azul e sua moto, pelo meio da rua, na chuva, com nossas mochilas nas costas. 

Chegamos até uma rua principal onde haviam dois táxis esperando. Eles pareciam com muita pressa. E assim que cheguei perto do táxi, o motorista arrancou a mochila das minhas costas, que se enroscou na minha bolsa e no meu braço. E num golpe, atirou a mochila, e meu braço preso à ela, dentro do porta-malas. Quase fui decapitada!

O carro era uma adaptação, e pra caber mais passageiros, parte do porta-malas havia sido transformada em bancos. O motorista esbravejante, mandou eu sentar na ultima fileira, com mais um casal soterrado em baixo de suas mochilas. Obviamente não cabiam 3 pessoas naquele lugar, mas haviam de caber. Sentei com uma perna por cima da perna da outra menina e metade da bunda pra fora do assento, na posição mais confortável do mundo. Mais 3 meninas e suas mochilas gigantes dividiam o banco da frente, e mais à frente ainda o motorista e outra menina com mais duas mochilas. Parecíamos uma lata de sardinha!

O motorista saiu dirigindo loucamente no trânsito de Hanoi, buzinando pra todos os lados, até receber uma ligação. Falou alguma coisa e retornou, depois de uns 10 minutos, para o mesmo lugar da nossa partida. Com cara de quem "não está entendendo nada", todos nós nos olhamos. E uma das meninas da lata de sardinha disse em tom de ironia: 

-Vai ver ele voltou pra buscar mais alguém!

Caímos na gargalhada, que durou até o motorista voltar com uma outra menina e sua mochila. Ele abriu a porta do banco de trás, e gritava para que ela entrasse ali. Era impossível!!!

Mas nada é impossível na Ásia. Sempre cabe mais um. Elas sentaram uma no colo das outras, colocaram as mochilas em cima de tudo, e assim fomos, por 20 infinitos minutos até a estação de ônibus.

Chegando na estação um terceiro cara nos encaminhou até os ônibus e distribuiu aleatoriamente as passagens pra cada um. Éramos uns 17 turistas trouxas até o momento. Eu fui correndo até uma vendinha e consegui comprar uma caixa de biscoitos antes de partir. Foi a minha única refeição nas 20 horas de viagem até o Laos.

Larguei a mochila no bagageiro e procurei um lugar pra sentar enquanto os outros passageiros largavam suas malas e preparavam-se pra entrar no ônibus. Sentei num banco próximo a outros motoristas e comecei comer meus biscoitos. Um deles chamou o amigo e os dois sentaram próximo à mim e ficaram falando coisas que eu não entendia, e olhavam fixamente pros meus peitos, apontando e dando risada. Devem ter ficado impressionados com o tamanho, já que para os padrões asiáticos devo parecer uma Cicciolina! Eles foram chegando tão perto, que eu pensei que o próximo passo seria estender a mão e tocar em mim. Olhei furiosa pra eles, mas não queria levantar. Perguntei se eles estavam olhando pra minha caixa de biscoitos, se eles queriam um. Depois passei a xinga-los em português, e por ultimo, totalmente acuada, levantei do banco e me dirigi pro ônibus.

Os ônibus no Vietnã são extremamente criativos. Ao invés de cadeiras reclináveis são camas, colocadas em dois andares, como num beliche. São 3 camas em cada fileira, e para caber mais gente, as últimas fileiras, no fundo do ônibus, são camas juntas, como se fosse uma cama de casal, mas que devem caber 3 pessoas, em baixo de uma outra cama, num lugar sem janelas, e ao lado da porta do banheiro. Basicamente uma caverna com um colchão. Parecida com aquelas tendas que crianças fazem para brincar. Era nesse lugar que eu devia sentar, com mais um casal de turistas trouxas. 

Fui pro meu assento na caverna e bastaram 5 minutos pra me sentir totalmente sufocada do calor aliada a falta de circulação de ar! Fiquei de pé no corredor até todos os passageiros se sentarem, e então percebi que eles separavam os turistas trouxas dos vietnamitas. Os turistas ficavam todos nos últimos assentos, os piores, enquanto a elite dominava os assentos da frente. 

Todos sentados, percebi que os assentos do meio do ônibus estavam vazios. Peguei as minhas coisas e sentei numa outra cama vazia. Assim que o ajudante do motorista me viu sentada ali, veio até mim e começou a gritar coisas que eu não entendia, mandando eu voltar pro meu assento. Eu dizia que era impossível viajar por 20 horas naquela caverna e que eu não voltaria pra lá. Ele não me entendia e berrava a mesma coisa, cada vez mais bravo. Então, ele pegou as minhas coisas e começou a levar pra fora do ônibus, me mandando descer já que eu não queria voltar pra caverna. Nessas alturas já estava muito nervosa e berrava cada vez mais, enquanto todos os outros turistas trouxas e os vietnamitas da elite só me olhavam.

Com medo, voltei pro fundo do ônibus e fiquei de pé até ele começar a se movimentar. Assim que apagaram as luzes pulei de novo na cama no meio do ônibus, agarrada nas minhas coisas, pensando que a qualquer momento o ajudante louco do motorista, viria até mim e me jogaria pra fora, no meio da estrada. Tive os mais terríveis pesadelos nessa noite. 

O ônibus seguiu no estilo Vietnamita de direção! Buzinando o tempo todo, de um lado pra outro na pista, freiando de forma brusca.

Chegamos na fronteira às 5 da manhã, mas a fronteira só abria as 7. Esperamos por duas horas até nós encaminharmos ao lado da fronteira do Vietnã. Pagamos a propina básica para os agentes da polícia carimbarem nosso passaporte de saída, e mais uma propina para os ajudantes do motorista que carregavam os nossos passaportes. 

Atravessamos a pé para o lado do Laos, enquanto os passageiros da elite foram levados de ônibus, os trouxas caminharam uns 2 kms até a imigração no Laos. Mais algumas horas de burocracia no lado do Laos e voltamos pro ônibus.

Quando entramos, duas trouxas perceberam que haviam deixado seus celulares dentro do ônibus, e que esses não estavam mais lá. Todo mundo procurando, em todos os lugares, elas avisam ao motorista que os celulares sumiram. Eles fazem cara de que não entenderam. Elas já estavam conformadas com a perda dos aparelhos quando o ajudante louco do motorista aparece com os dois celulares, tentando explicar algo que não entendemos. Enfim elas suspiram aliviadas. 

Fizemos a parada do almoço em um lugar na estrada difícil de ser chamado de restaurante (olha que não sou nada fresca, e com a viagem tenho me tornado muito menos), mas servia comida para os passageiros que ali paravam. Saímos do ônibus pra tomar um ar, quando vimos que no teto do ônibus, ao lado do nosso, haviam dois filhotes de cachorros. O que faziam dois filhotes de cachorro em cima do ônibus? Estavam sendo "transportados" em caixas que se abriram e eles com muito calor e sede fugiram. Estavam tentando sair de cima do ônibus, mas eram muito pequenos e acabaram caindo. Um deles parecia morto, o outro estava chorando de dor. A cena mais horrível que eu podia ter visto.

Enquanto isso acontecia, os turistas todos alarmados com a situação, juntaram-se ao redor do cachorrinho sobrevivente para tentar ajudá-lo, enquanto os vietnamitas ficavam apenas observando, sem mexer um dedo, somente acompanhando os movimentos dos turistas.

Fomos chamados pra voltar ao nosso ônibus, e os cachorrinhos ficaram lá, sem que ficássemos sabendo o seu destino. 

Antigamente, no Vietnã, era comum comer carne de cachorro, hoje em dia apenas alguns lugares ainda apreciam essa iguaria. Talvez esses dois filhotes virassem o almoço do dia seguinte nesse restaurante de beira de estrada.

Depois dessa ultima parada faltavam poucas horas pra chegarmos no nosso destino. Cheguei cansada, com fome, suja, suada, mas feliz por ter sobrevivido a essa "maravilhosa" experiência de viagem. E o meu hostel tinha piscina, não podia ter ficado mais feliz!

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