sábado, 7 de fevereiro de 2015

Se tiver medo, vai com medo mesmo!

Conheci uma menina brasileira de 21 anos no hostel que estava hospedada em Barcelona. Algumas horas de conversa, e percebi que ela nasceu e foi criada em uma família de classe média alta carioca.
A menina estava passando por uma situação difícil, de ciúmes e briga com o namorado, no meio de uma viagem de férias financiada pelos pais. E ela simplesmente não soube resolver os seus problemas sozinha. Durante a calorosa discussão que presenciei, eles usaram seus celulares de número brasileiro (imagina quanto isso custava) para ligar para mãe e para o pai, do outro lado do oceano, pedindo ajuda com o que estava acontecendo ali. Demonstravam tremenda fragilidade, dependência, insegurança, e acima de tudo um medo enorme por não saber como agir, longe de tudo aquilo que lhe és familiar. Não julgo a reação dessa menina, porque eu mesma, na mesma idade, fiz ligações do hemisfério norte para que a minha mãe no Brasil tentasse resolver os meus problemas.

Conheci uma outra menina, americana, 19 anos, num hostel na Eslovênia. Menina comunicativa, sorridente, de pais chineses mas criada nos Estados Unidos. Em algumas horas de conversa pude perceber que ela teve uma educação rigorosa, mas ao mesmo tempo de muita liberdade. Ela estava viajando sozinha pela Europa durante dois meses, fazendo couchsurfing (dormindo em sofás de gente desconhecida), de ônibus, planejando a cada dia sua rota e administrando o seu dinheiro. Estava feliz, e já fazia planos para sua próxima viagem.

E aí, pensando nessas duas meninas, fiquei me perguntando: o que diferenciava a atitude delas? Porque uma estava tendo as piores férias da vida e a outra as melhores?A resposta surgiu! O medo! Nós brasileiros nascemos e crescemos num país cheio de medo. Medo de sair na rua, medo de não conseguir emprego, medo de faltar dinheiro, medo de estranhos, medo da solidão, medo o tempo todo, e por todos os lados. E pais como o dessa menina, e também como os meus, obviamente criaram seus filhos protegendo-os desse medo, e dessa insegurança toda. O resultado? Nós brasileiros somos medrosos! Estamos despreparados para enfrentar os problemas da vida, temos medo das mudanças, do novo, e ficamos estagnados. 
Ter medo é natural, enfrenta-los é o que faz de nós pessoas mais felizes e realizadas. No momento que mentalizamos que tudo dará certo, que não ficamos obcecados por controlar todas as situações, que tentamos enxergar o lado positivo até da pior situação, tudo passa a fluir e acontecer da melhor maneira possível.

A viagem da menina americana já terminou. Ela postou um monte de fotos bacanas em diversos países que visitou, e de pessoas que conheceu. Ela também me contou que em alguns momentos teve medo, que se perdeu à noite, que teve que se livrar de um cara que tentou seduzi-la, que perdeu dinheiro comprando passagens erradas, mas nada que ela não soubesse lidar e principalmente tirar lições para a vida.
A viagem da brasileira ainda não terminou. Ela ainda tem mais 7 dias em solo europeu. Sem falar com o namorado terá que se virar sozinha até voltar para o Brasil. Durante sua estada em Barcelona ela saiu somente duas vezes, naqueles ônibus de turismo, sem descer em nenhum ponto. Está contando as horas pra voltar pra casa da mãe.

Sei que essas duas meninas, assim como eu, somos privilegiadas por uma condição financeira bem diferente da maioria da população brasileira. Mas eu, acredito que todas as pessoas, de qualquer lugar do mundo, de qualquer condição social, podem aprender a lidar melhor com seus medos e por fim, vencê-los. Aprender isso daria poder às pessoas, que poderiam ter mais controle de suas vidas, e força para realizar seus sonhos e desejos. Teríamos mais vitoriosos, menos frustrados, e sucessivamente um mundo melhor.

As forças ocultas do universo!

Depois de mais de uma semana dormindo num quarto privado, em airbnb e em casa de amigo, depois de seis meses de viagem, voltei para a vida de hostel em quarto compartilhado.
Ontem era um vai e vem de homens passando de cueca como se estivessem em casa. O mesmo papo de sempre se repete. De onde vc é? Brasil! Eu sou de Nova York. Como se todo mundo no mundo tivesse que saber onde é NY. Da próxima juro que respondo que sou de Porto Alegre, sem falar que sou brasileira!
Coloquei o meu fone de ouvido que serve como repelente, mas a animação desses viajantes de férias não é inibida por um simples fone. Querem conversar, falar, saber por onde vc já esteve na cidade, numa ânsia de não perder nada.
Eu, cansada, só queria ficar na minha, repudiava aquele desfile de corpos, e todo aquele falatório na minha frente! Dormi o dia todo, aproveitando o quarto vazio para relaxar por algumas horas.
Não é fácil, realmente chega a hora que cansa. Cansa de não ter mais privacidade, de dormir com barulho e luz, de ser obrigada a conhecer gente nova, de ser simpática, de vestir a mesma roupa, simplesmente cansa! E eu estava me sentindo cansada quando passei pela recepção sorrindo (isso sempre), e a menina brasileira da recepção me chama pra me apresentar outra brasileira.
Meio de saco cheio conto resumidamente sobre a minha viagem, quase colocando pra rodar a gravação que tenho sobre o tema, toda vez que me perguntam. A menina nem pisca para ouvir o que estou falando, e quando termino, com o olhar mais espantado possível diz: Nossa, como vc é corajosa, gostaria de ter essa coragem! 
Já ouvi isso algumas vezes, mas confesso que hoje teve um valor especial. Me fez lembrar que sim sou corajosa, e que devo jogar esse meu cansaço para baixo da cama, e seguir adiante! Aproveitar cada minuto dessa experiência incrível que muita gente gostaria de experimentar. 
E viva assim aos corpos semi nus passando pela minha frente todas as manhãs!

Parte II de sou corajosa e tenho que espantar o cansaço!
Saio do hostel decidida a embarcar no ônibus para Bilbao que partia as 11 da noite. Coloca toda as malas nas costas, pega metrô, troca de estação e chega com uma hora de antecedência na estação. Vou até o gichê pra comprar a passagem, mas num inteligente sistema de vendas de passagem, para o ônibus que sai daquela estação devo comprar o ticket numa outra estação.
Saio correndo, volto pro metrô, e tento chegar à tempo na outra estação para pegar o bus que saia de lá as 22:45. Chego em cima da hora, mas o guichê de venda de passagens já está fechado. Mas há uma máquina de venda de passagens, minha última chance. Tento de todas as maneiras comprar o ticket mas não funciona de jeito nenhum. Perdi o ônibus. Respira fundo, pega a mochila e volta pro hostel! 
Como sou uma menina de muita sorte o pessoal do hostel me recebeu de braços abertos.
É isso aí, a resistência me persegue, mas eu não to nem aí pra ela! Amanhã tentamos de novo! E vamos que vamos que Bilbao me espera!

Parte III do dia que poderia virar um conto!

Sentada na recepção, relaxando antes de voltar para o quarto, entra o menino brasileiro, namorado da brasileira que tinha conhecido à tarde. Ele está chorando carregando todas as suas malas de volta.
Ele começa a falar com a moça da recepção pedindo desculpas pelo o acontecido.
A mesma moça da recepção que tinha me apresentado a sua namorada agora diz pra ele sentar comigo ali e me pedir alguns conselhos. Eu com certeza poderia ajudá-lo. 
Eu??? Eu mesma??? 
Ele senta ao meu lado e começa a contar a história de briga e paixão entre ele e a namorada. Eles haviam discutido (não entendi muito bem porque), e num acesso de fúria ele tinha resolvido ir embora é deixar a menina ali!
Claro, uma decisão muito coerente com sua idade. Ele tem apenas 21 anos e me conta detalhes de seu longo namoro de um ano, dizendo que se ela realmente amava ele não teria mandado aquela mensagem para um outro carinha há seis meses atrás. Ai, ai, sério? Agora sou terapeuta de um jovem menino apaixonado e inconseqüente.
Nem sei bem o que estou dizendo pra ele, quando ele me pergunta: vc já sofreu em algum relacionamento?
Ai, ai de novo. Sim, se eu não tivesse sofrido não teria nunca me relacionado. Faz parte da vida, faz parte do amor.
E vamos que vamos que amanhã é um novo dia repleto de amor! Disso eu tenho certeza!

Parte IV da saga para Bilbao

Sei que muitos vão ler isso e pensar, "nossa, como ela é criativa para inventar histórias", mas eu juro que tudo descrito aqui reflete a verdade, somente a verdade, e nada mais além da verdade.

Há três dias atrás decidi que visitaria Bilbao. No primeiro dia, decidi que pegaria o bus que partiria pela manhã, e coloquei o despertador do celular pra tocar cedinho. O celular tocou, tocou denovo, e denovo! E eu? Perdi o horário! Uma coisa simples, que as vezes acontece, comigo quase nunca, mas naquele dia aconteceu. Tudo bem, tentamos de novo amanhã. 
No dia seguinte decidi pegar o ônibus da noite, e aconteceu tudo aquilo que contei no post passado.
E aí, finalmente ontem, decidi fazer tudo certinho pra que NADA pudesse dar errado. Coloquei o despertador pra acordar cedo. O despertador tocou e eu levantei. Fui ao terminal de ônibus comprar o ticket para o ônibus. Comprei o ticket com horas de antecedência.
A noite, mais de uma hora antes do horário da partida sai do hostel com destino ao terminal. Cheguei lá, tudo certo, o ônibus está lá, coloco a mala no bagageiro, tudo certo, me sento no meu banco confortavelmente e aguardo.
O ônibus parte com destino à Bilbao! Uhu!!!!
Depois de andar duas quadras o telefone do motorista toca e ele para o carro no meio da rua.
Depois de uns minutos falando no celular, levanta-se e comunica os passageiros.
"Acabo de receber a informação que a estrada que vai até Bilbao está bloqueada por causa da neve. Não poderemos realizar o serviço hoje  e estamos voltando a Barcelona".

Bom, na linha do que acredito, nada nessa vida acontece por acaso. E por algum motivo o Universo não quer que eu vá pra Bilbao. 
Tá bom! Já entendi! Mudança de planos, mudança de rota! E vamos aproveitar um pouco de Barcelona porque ela merece, depois de tudo isso.

P.S: quando retornei ao hostel presenciei, e participei quase obrigada, de uma das brigas de casais mais agressivas que vi na minha vida. Mas essa eu vou deixar pra contar depois, porque se não, ninguém mesmo vai acreditar que tudo isso pode acontecer numa mesma viagem! Heheheh

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

Seis meses depois...

Viajei de ônibus, trem, barco, carro, e avião. Fui de bicicleta, andando, de mototáxi, riquixá, metrô, charrete e cavalo. Dormi em quarto com 12 pessoas, com 6, com 4, sozinha, em hotel, airbnb, sofá de amigo, cadeira de aeroporto, barraca e colchonete no chão. Tomei banho frio no inverno, e pelando no verão, fiquei sem banho alguns dias. Comi coisas que não sei o nome, passei fome, comi até morrer, cozinhei, compartilhei comida com estranhos, estranhos compartilharam comida comigo. Fiquei com frio, muito frio, fiquei com vergonha, perdida, com medo, ansiosa, indecisa, triste e muito feliz. 

Visitei 17 países, 64 cidades em 184 dias.

Quando há exatos 6 meses atrás bati a porta da minha casa em São Paulo, deixando tudo pra trás, sentia que aquela era a grande chance para experimentar o desconhecido e me reinventar. O que eu não sabia é que o pano de fundo sim mudaria, mas eu, continuaria a mesma. Seria necessário um grande esforço para a mudança que eu tanto desejava acontecer.

A rotina agora é diferente, mas ainda existe, cometo os mesmos erros, apenas com diferentes pessoas em diferentes cenários. Reafirmo coisas que não sou, encontro o passado no meu caminho e me agarro à ele com unhas e dentes, numa resistência ao novo. Tento controlar o incontrolável, o rumo da vida, os sentimentos no meu coração.

Viajar, definitivamente é uma fuga, é a desculpa perfeita para fazer coisas que não se faria estando diante dos olhos de quem lhe conhece. É libertador, deixa o mundo sem limites, empodera, da força, e confiança. É como uma droga, vicia.
Viajar, acima de tudo, traz auto conhecimento. E como se o olhar pra fora, para as novas paisagens, ajudasse a enxergar o lado de dentro. 

Não sei o que será daqui pra frente. No meu caminho só incertezas. O que agora sei, passado-se os seis primeiros meses, é que quero ser uma pessoa melhor, aceitando as minhas fraquezas, admitindo minhas limitações, num eterno exercício de rever atitudes, posicionamentos e opiniões.

E assim sendo, embarco hoje em uma nova viagem. Que venham os próximos meses!