quarta-feira, 29 de abril de 2015

Se eu pudesse te dar um conselho...

Se eu pudesse te dar um conselho eu diria, não leve a vida tão a sério.
 
Não faça dos momentos ruins fardos tão difíceis de carregar. Os momentos ruins chegam, não adianta fugir deles. Eles estão nos atrasos, das pessoas e dos momentos da vida. Eles estão numa doença fora de hora, na noite sozinha na cama, na solidão em uma casa cheia, nas palavras não ditas, nas expectativas frustradas. Aprendi viajando que até mesmo em Paris, ou no mar azul do Caribe, os momentos ruins aparecem. Quando chegarem, observe, entenda, e não queira que passem depressa, apenas levante e siga em frente. Ninguém é responsável pelos momentos ruins além de nós mesmos. Só coloque-os nas costas, e carregue-os até a próxima estação.
 
Não sofra com a dúvida, com a indecisão. Siga o que o seu coração mandar. Não importa o caminho que tomar sempre haverá coisas boas e ruins pra encarar. Decidiu ficar, não pense no que deixou de encontrar, de conhecer. Decidiu seguir adiante, não pense no que ficou pra trás. Decidiu comer o bolo de chocolate, coma até a última garfada, se possível lamba o prato. Decidiu correr no parque pela manhã, não pense na cama quentinha, calce o tênis e vá. Decidiu deixar o trabalho de anos numa empresa de prestígio, apenas peça demissão, não pense na carreira que deixou de construir. Vivenciei viajando que sempre haverá milhares de opções, decisões e escolhas. Os caminhos são inúmeros e as opções inesgotáveis, o segredo é apenas decidir, fazer, e usufruir até a próxima decisão.
 
Não faça planos. Sonhe, deseje e acredite, mas não trace planos tão detalhados que são impossíveis ou difíceis de seguir. A vida sabe melhor do que nós o que é melhor. Não deu pra guardar tanto dinheiro quanto planejado, mude os objetivos de compra. Não deu pra conhecer aquele lugar imperdível, conheça um lugar novo na vizinhança. Não deu pra chegar à tempo pra abraçar aquele amigo, faça uma ligação e marque um novo encontro. Percebi que a aventura e a felicidade começam quando tudo começa a dar errado. Perdi o voo, descobri uma nova cidade, fiz novos amigos. Perdi dinheiro, encontrei pessoas boas no caminho dispostas a ajudar. Não consegui o que eu queria, o que eu não queria apareceu na minha frente e era muito melhor.
 
Mantenha os olhos abertos, os ouvidos atentos e a mente quieta. A obstinação e a teimosia dificultam perceber novos caminhos, novas soluções. Viva cada momento, no presente. Deixe o passado e o futuro de fora. Eu nunca quis vir parar nesse lugar, mas as coisas aconteceram, surgiu a oportunidade e aqui estou, feliz!
 
Não faça julgamentos ou comparações. Não haverá de ser melhor ou pior, apenas será diferente. Uma praia da Tailândia poderá ser mais bonita do que uma praia no Brasil? Um encontro com antigos amigos será melhor do que com amigos que acabei de conhecer? Se houver comparações sempre haverá julgamento, e nada, nunca será suficientemente bom. As pessoas e os lugares são do jeito que são, e só.
 
Não crie expectativas, do emprego dos sonhos, da casa ideal, do relacionamento ideal. Aprendi nos meus últimos meses de viagem que a felicidade pode estar no trabalho mais simples, no uso da força braçal ou dos talentos mais natos. Que a casa ideal não precisa ser exclusiva, pode ser compartilhada, pode ter passarinhos cantando pela manhã ou uma vista pro horizonte, pode ser de madeira com frestas no chão, ou muito pequena. E o amor pode estar numa conversa corriqueira, numa ideia compartilhada, num abraço fora de hora, numa música cantada juntos, numa risada de uma piada boba, no silêncio dos pensamentos.
 
Levar a vida à sério, condicionando a felicidade à conquista de um carro novo, de uma promoção de trabalho, da aquisição de uma mobília nova, de uma refeição num badalado restaurante, de um corpo perfeito, de um encontro com os amigos ou na viagem de final de ano, é a maneira mais fácil de viver, e também a mais frustrante. Viver de forma simples e feliz, sem excessos, sem aquisições desnecessárias, sem expectativas com os relacionamentos, trabalhando duro e em harmonia com a natureza, isso sim, é difícil.
 
Depois de quase nove meses viajando pelo mundo sei que tenho mais dúvidas de quando iniciei a viagem. Dúvidas do que ser, do que perseguir, do que desejar, e pra onde ir para alcançar essa vida simples e feliz. Hoje apenas sinto que estou mais tranquila, mais segura e mais corajosa. Por isso que não sou a pessoa mais indicada para sair por aí distribuindo conselhos. O que desejo, é apenas que mais amigos sigam por esse caminho que decidi seguir, e que juntos tenhamos histórias pra contar, e no futuro, conselhos pra compartilhar.
 
Será mesmo que a praia na Tailândia é mais bonita que no Brasil?

domingo, 12 de abril de 2015

Os 10 dias de silêncio.

Não sei bem de onde saiu essa ideia maluca de fazer um retiro de 10 dias de silêncio. Quando eu estava lá, em silêncio de fala, mas em conversa com a minha mente, que mais parecia uma reunião de condomínio de tão confusa e cheia de interesses, esse assunto veio à tona. "Como eu vim mesmo parar aqui?"
Há algum tempo atrás estive pesquisando muito sobre a Índia e seu lado espiritual, e acho que foi dessa pesquisa que tudo isso surgiu. E aí lendo sobre a experiência dos meus amigos, Dri e Manu na Tailândia, fiquei ainda mais curiosa, e então decidi aproveitar a oportunidade e encarar o desafio.
E que desafio! Por algumas vezes pensei que qualquer coisa deveria ser melhor do que estar ali, até mesmo uma prisão ou um hospício (juro que esse pensamento me ocorreu), e eu estava fazendo isso por vontade própria! Ninguém me prendia ali, e eu poderia dar as costas e ir pra alguma praia paridisiaca tomar cerveja e comer camarão, mas o que me fez ficar foi a minha teimosia aliada a uma enorme sede de auto-conhecimento.
A rotina não era nada fácil. Todos os dias acordávamos às 4 da manhã e meditávamos aproximadamente umas 7 horas por dia, mais as aulas de meditação e yoga. A alimentação era restrita à duas refeições vegetarianas, sendo a ultima servida ao meio dia. No café da manhã tinha todos os dias a mesma sopa de arroz. Sim, sopa de arroz no café da manhã! E a noite eu sonhava com uma torrada de queijo (misto quente para os paulistanos)...
Além disso, dormíamos numa cama que era uma esteira com travesseiro de madeira e tomávamos banho de canequinha. Eu levei mais ou menos um 9 dias pra entender como fazia pra lavar o cabelo desse jeito. Fora o calor, que era insuportável durante as noites sem ventilador no quarto. E ainda haviam algumas regras que deveriam ser seguidas. Não escrever nenhum diário, não ler nada, não ouvir música, não deitar em nenhum lugar durante as atividades, não comer nada além das refeições oferecidas, entregar celular e computadores, e não falar, claro. Acho que a parte do "não falar" foi a mais fácil de todas, aliás ajudou muito a manter a serenidade.
Pra mim, definitivamente os primeiros e os últimos dias foram os mais difíceis. No primeiro e no segundo dia achei que ia morrer, que não ia aguentar, que dez dias era uma eternidade, que preferia ficar dez diais trabalhando em um Construction Review do que ficar ali. Mas aí a mente foi se acalmando, o corpo se acostumando às posturas de meditação, e com as aulas de meditação, do terceiro ao oitavo dia, tive meu melhor rendimento. Nunca imaginei que a meditação fosse capaz de me proporcionar momentos como os que experimentei em Suon Mokkh. Às vezes tinha a sensação que aquilo era melhor que sexo, ou ainda melhor que muita droga (ai, se Buda sabe que eu pensei isso), e às vezes, depois da meditação, achava que tinha encontrado a resposta pra muitos dos meus problemas. Mas confesso que esses momentos foram poucos. A maior parte do tempo, sentada no chão, tudo o que eu conseguia pensar era na dor nas costas, na perna, no joelho, no pescoço, ou então no meu plano de viagem ou em burrices do meu passado, ou ainda em coisas banais, como letras de música dos Mamonas Assasinas ou em cenas de filmes bobos como o Virgem de 40 anos. Aaaaa não me pergunte como essas coisas foram parar na minha mente no meio de um retiro de meditação, mas elas estavam lá, infiltradas em outros pensamentos mais profundos sobre minha vida.
Depois de aprender e praticar algumas das lições básicas do Budismo como o desapego, o foco no presente, que tudo é finito, o não julgamento, eu cheguei à algumas conclusões e tive alguns "insights" (muito pessoais e um pouco chocantes pra eu expor aqui). Pela primeira vez na vida tive interesse em aprender mais sobre uma religião. Me identifiquei com muitos dos conceitos e pretendo estudar mais a religião (que aliás é bem complexa) e desenvolver ainda mais esse lado espiritual.
Acho que ainda tenho que dar um tempo e "digerir" tudo o que se passou nesses 10 dias. Ontem pela manhã tudo o que eu queria era sair correndo de lá, estava cansada de tanta meditação e feliz por concluir o retiro, mas posso afirmar que muita coisa mudou dentro de mim. Prova disso é que fiquei 11 dias sem beber, e hoje quando tive oportunidade de beber aquela cerveja bem gelada, simplesmente não tive vontade. Mas comer a torrada de queijo, isso sim, eu comi! Hummmm, e tava uma delícia!