segunda-feira, 23 de julho de 2018

A verdade é que dói!


Criei um hábito de contar e repetir para toda e qualquer pessoa que se interessa pela minha gravidez, que eu nunca antes havia pensado em ser mãe. Muitas vezes sinto que ficar repetindo isso aos quatro ventos me torna uma mulher negligente e irresponsável, uma mãe sem coração. Não sei se as pessoas pensam isso mesmo, ou se não dão a mínima bola quando eu falo em tom de muitas exclamações que eu nunca imaginei ser mãe, mas para mim a afirmação direciona para um julgamento instantâneo, de que não está certo falar isso, afinal ser mãe é uma "benção". 

Eu acredito que por não ter essa pretensão, eu nunca obtive informações sobre a gravidez, e em consequência eu não tinha a mínima ideia de que estar grávida podia causar tantas dores. 

As dores surgiram logo no início. Começaram com dores de estômago e cólicas, incômodos e coceira nos seios que cresciam rápido demais. E seguiram em dores nas costas, e nas pernas por dificuldade de circulação. Continuo tendo incômodos na hora de dormir, na hora de caminhar, na hora de ir no banheiro, e outras coisinhas que nem sei se vale mencionar. O peso da barriga atrapalha. Todas as roupas apertam. Ficar sentada por muito tempo é ruim, ficar deitada faz meu ciático doer. Eu me sinto muito gorda, caminhando como uma pata. Amarrar o sapato é difícil, subir uma escada é cansativo, lavar a louça só de ladinho, e sentir o bebê mexer nem sempre é a sensação mais agradável do mundo. Fora o sono, que às vezes é incontrolável. E as restrições alimentares, afinal você é responsável por nutrir um pequeno ser humano que está se desenvolvendo dentro de você. Às vezes tenho crises de raiva, e só consigo pensar na possibilidade de poder arrancar a barriga por um tempinho para me sentir menos indisposta. Fora as variações de humor, as crises de choro, o medo e a ansiedade. 

Se você for como eu, vai ler tudo isso e pensar que estou tendo uma péssima experiência, que estou sendo negativa, cruel e injusta. É, parece que falar, salientar e reclamar disso tudo me torna uma péssima mulher. E por que mesmo? Por que me sinto tão culpada de falar sobre as dores e dificuldades da gravidez?

Porque eu nunca ouvi ninguém falar sobre isso! Porque nunca me ensinaram na escola as etapas de uma gestação. Porque nunca me ensinaram sobre o parto natural e sua importância, porque nunca, nenhuma mulher ou homem me alertaram para os riscos, para os cuidados, e para os sintomas de gestar uma vida dentro do meu corpo. É quase como um assunto velado. Falar disso é feio, te torna uma pessoa ruim. Pois afinal eu deveria estar feliz e agradecida por ter a oportunidade de ser mãe, e só. E é verdade. Sim, eu estou feliz e muito agradecida por tudo estar dando certo na gravidez, por todas as descobertas e mudanças, por todo o autoconhecimento que desencadeia a cada nova etapa, mas isso não muda nada as horas de dores físicas e emocionais.

A questão é que tenho muitos privilégios, e tenho muito apoio da família e da empresa em que trabalho para passar por essa etapa. Mas as mulheres que não os tem? E as mulheres que trabalham em atividades braçais, que não podem parar de trabalhar até o bebê nascer, e que tem que continuar com suas responsabilidades domésticas? E as mulheres que não tem direito a licença maternidade, ou que não tem quem assuma o trabalho doméstico durante a sua gestação? E as que não tem nenhum tipo de suporte emocional?

Não há espaço para essa discussão, não há espaço para falar abertamente sobre as dificuldades, sobre a fragilidade da mulher nesse período, e ignorar tudo isso ainda ajuda na manutenção do nosso sistema. Melhor mesmo banalizar e transformar os desconfortos em privilégios e piada, como na tirinha abaixo (de uma página do Face). Afinal as mulheres grávidas, estão só grávidas e não tem nenhuma necessidade específica. Devem continuar produzindo, e devem manter suas responsabilidades profissionais e domésticas. É quase um: fica quietinha, para de reclamar, continua trabalhando, em casa e no trabalho, logo isso vai passar e todas essas dores serão esquecidas. Foca a tua atenção no deleite de ser mãe, e agradece!

Fico só imaginando se fossem os homens a passar por tudo isso, com certeza o resultado seria muito diferente...



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